domingo, 25 de fevereiro de 2018

Saber conviver

Em nosso grupo de estudos espirituais, comentava-se sobre a dificuldade da convivência, a começar com os próprios familiares.
Disse-lhes, então: li uma página muito interessante escrita pelo espírita e psicólogo Adenauer Novaes sobre o assunto e estou com o livro aqui, vamos dar uma lida?
- Será interessante, adiantou-se Aparecida.
- Adenauer comenta: “A vida a dois, por mais amor que exista, é sempre o desafio no qual a união harmônica deveria prevalecer no final. O encontro inicial se dá por vários fatores que fazem com que uma pessoa se relacione com outra.
Para a manutenção da relação devem concorrer os seguintes requisitos: identidade de propósitos, amizade e atração sexual. Sem eles a relação corre o risco de se tornar instável. Quando um deles falta, o casal deve tomar consciência disso e buscar juntos alternativas de solução.
Psicologicamente uma relação é a busca por um complemento que se realiza de forma arquetípica. São opostos que tentam se reconciliar no encontro amoroso, e assim o fazem para que a necessária coniuctionis ocorra, isto é, para que cada um integre em si o que projeta no outro e o que com ele apreende.
Cada um busca seu complemento, por esse motivo não deve esperar que pensem da mesma maneira ou que gostem das mesmas coisas. Querer a igualdade entre os dois é anular um deles.
Não se deve pensar que, por serem diferentes, não possa a relação dar certo ou ser bem conduzida.
Um outro na vida de alguém deve levá-lo ao encontro consigo mesmo e à transformação de que necessita na vida. A união a dois deve levar ambos ao autoconhecimento, à descoberta de si mesmo, à transformação na vida social e à iluminação do Espírito”. (1)
Mais adiante, comentando a convivência no lar, ele prossegue:
“Podemos sonhar com um lar no qual gostaríamos de viver, com características ideais e que nos permitisse viver em paz e feliz. Porém, esse lar é sempre fruto da construção pessoal de cada um. Não é algo que recebemos gratuitamente, mas que construímos ao longo das vidas sucessivas do espírito que somos.
Pode-se pensar num lar onde haja discussões e preocupações, visto que são contingências naturais da vida em grupo. A vida, mesmo num ambiente de harmonia, exige que não se perca de vista o nível de evolução de cada pessoa e suas dificuldades íntimas.
Construamos um lar como um ambiente de paz e harmonia, mas constituído por pessoas que possam, momentaneamente, apresentar algum tipo de insatisfação ou angústia. Afinal de contas a Vida oferece desafios constantes, os quais nos cabe vencer e com eles aprender”. (2)
Não são interessantes as considerações que ele entretece sobre a compreensão e a divergência, o conflito e a paz; a busca da igualdade e a diferença?
- De fato, o entendimento e a paz nunca serão frutos da submissão e da mesmice, ponderou Claudio.
- Sim! A liberdade de pensamento é um direito consagrado nas legislações avançadas e em O Livro dos Espíritos; nele encontramos a seguinte colocação, na questão nº 833: “No pensamento goza o homem de ilimitada liberdade, pois que não há como pôr-lhe peias. Pode-se-lhe deter o vôo, porém, não aniquilá-lo” (3)
Interpôs Margarida:
- Então como encontrar o equilíbrio necessário?
- Nas insatisfações e conflitos vamos procurar exercitar os princípios da Justiça: reconhecer os direitos do outro e claramente delimitar os nossos.
- Belo desafio! Foi o comentário do grupo.
- Vamos enfrentá-lo?
 Desafiou Nilson

Bibliografia:
(1) e (2) - O Evangelho e a Família, Adenauer Novaes, Editora Fundação Lar Harmonia, páginas 57 e 58;
(3) – O Livro dos Espíritos, Allan Kardec, Editora FEB.

Aylton Paiva é estudioso da Doutrina Espírita para sua aplicação na pessoa e na sociedade (www.ayltonpaiva.blogspot.com).


Obs.: Artigo publicado em 02/03/2012, no Jornal Correio de Lins

domingo, 18 de fevereiro de 2018

À hora do entardecer

(Reflexão)
O nascer do sol majestoso e sorridente sempre anuncia a renovação incessante da vida na terra. Com raios luminosos acaricia plantas, fortalece as vidas vegetais e animais... Aquece o pântano.  Permanece esplendoroso, intocável, soberano, exalando energia na imensidão do universo, atravessando vales e ignorando fronteiras.
No entanto, o dia tem suas horas, suas mudanças climáticas, obedecendo às leis da natureza que divide o tempo entre: o sol, a lua, a chuva, o frio. As horas radiantes disponíveis à soberania solar sempre vem alcançar com eficiência e objetividade as determinações das leis naturais que o leva a suprir as necessidades de sobrevivência das espécies existentes no planeta, até ser envolvido pelo brilho das estrelas cintilantes bordadas no fundo negro do firmamento.
A sabedoria do planejador supremo das leis que regem o universo deixa evidenciar a harmonia que reina entre tudo que existe.
Não poderiam ser diferentes as leis que regem as vidas humanas, que também fazem parte desse sofisticado sistema. O choro do recém-nascido, qual trombeta a anunciar o sol de uma nova vida, nos chega, para depois de algum tempo se transformar em sorriso gracioso, e iluminar o lar, trazendo alegria aos componentes da família. A partir daí, a vida floresce, aquece corações, fortifica laços de amor e amizade... Trabalha, pensa, vive emoções de alegria e de tristeza... Sofre, recupera-se, e prossegue.
A estrada que encontra pela frente lhe dá opções, tem livre arbítrio, toma o rumo que desejar. Responsabiliza-se por todas as suas ações, boas ou más, não tem como fugir das responsabilidades assumidas, porque o arquivo da consciência tudo grava para os devidos acertos que definirá o grau do progresso alcançado, conforme determinação da supremacia criadora... Tudo é equilíbrio nesse reino magnífico em que vivemos.
A hora do entardecer da vida com certeza chegará, e, assim... O momento do descanso. Exausto, refletirá sobre o caminho percorrido, dificuldades superadas, laços de amor ou de ódio construídos, período de tempo aproveitado... Ou perdido, que não voltará. Assim será o fim do período concedido para o preenchimento do espaço reservado na terra ao burilamento da alma humana. Resta então, fechar com a chave da consciência tranqüila... Ou não, a janela pela qual enxergamos a vida, e aguardar na eternidade a oportunidade de um novo dia.
“NASCER, MORRER, RENASCER DE NOVO, TAL É A LEI”-(Allan Kardec).

Nelson Nascimento

e-mail: nelson.nascimento1@yahoo.com.br

sábado, 10 de fevereiro de 2018

Estranho culto

− Olá, passeando?
− Sim, visitarei meu filho...
− Como?! Ele não morreu?!
− Vou ao cemitério...
Esse diálogo surrealista ocorre com frequência. As pessoas dispõem-se a visitar os mortos no cemitério. Levam flores e cuidam com muito carinho do túmulo, a “última morada”.   Determinados cultos religiosos chegam a orientar seus profitentes no sentido de levar-lhes alimentos. E há a tradicional queima de velas, para “iluminar os caminhos do além”.
Certa vez, em minha infância, alguns companheiros e eu, garotos arteiros, fomos ao cemitério onde “afanamos” dezenas de velas, pretendendo usá-las em nossas brincadeiras.
Ao ter conhecimento da proeza, minha avó, uma velhinha italiana muito querida, zelosa das tradições religiosas, recolheu-as todas e, após admoestar-me com severidade pelo desrespeito, acendeu-as na varanda de nossa casa.
− Velas por intenção das Almas − explicou solene − devem queimar até o fim!
Dei graças aos Céus por vê-la desistir da ideia de obrigar-me a retornar ao cemitério, em plena noite, restituindo-as, acesas, aos “proprietários”. Com a generosidade que lhe era peculiar, aceitou o argumento de que seria impossível identificar exatamente as sepulturas de onde as retiramos.
Há uma incrível deformação nas concepções a respeito do assunto. Muita gente não consegue assimilar plenamente a ideia de que o Espírito imortal segue seu destino no Plano Espiritual, deixando no cemitério apenas vestes carnais em decomposição, que nada tem a ver com sua individualidade, tanto quanto o terno de um indivíduo não é o próprio.
A frequência aos cemitérios se configura, assim, como autêntico “culto aos cadáveres”, que desaparecerá na proporção em que a criatura humana assimilar noções mais amplas sobre a vida espiritual.
Ressalte-se que quando pensamos intensamente naqueles que partiram é como se os evocássemos, trazendo-os até nós.
Não convertamos, portanto, as necrópoles em “salas de visita do além”. Há locais mais aprazíveis para esse contato, principalmente para o “morto”. Se ele desencarnou recentemente e ainda não está perfeitamente adaptado às novas realidades, sentir-se-á pouco à vontade na contemplação de seus despojos carnais.
 Se pretendemos cultuar a memória de familiares queridos, transferidos para o Além, elejamos o local ideal: nossa casa. Usemos muitas flores para enfeitar a Vida, no aconchego do lar; nunca para exaltar a morte, na frieza do cemitério.
Eles preferirão, invariavelmente, receber nossa mensagem de carinho, pelo correio da saudade, sem selagem fúnebre.
É bom sentir saudade. Significa que há amor em nossos corações, o sentimento supremo que empresta significado e objetivo à existência. Quando amamos de verdade, com aquele afeto puro e despojado, que tem nas mães o exemplo maior, sentimo-nos fortes e resolutos, dispostos a enfrentar o Mundo.
E talvez Deus tenha inventado a ilusão da morte para que superemos a tendência milenar de aprisionar o amor em círculos fechados de egoísmo familiar, ensinando-nos a cultivá-lo em plenitude, no esforço da fraternidade, do trabalho em favor do semelhante, que nos conduz às realizações mais nobres.
Não permitamos, assim, que a saudade se converta em motivo de angústia e opressão. Usemos os filtros da confiança e da fé, dulcificando-a com a compreensão de que as ligações afetivas não se encerram na sepultura. O Amor, essência da Vida, estende-se, indestrutível, às moradas do Infinito, ponte sublime que sustenta, indelével, a comunhão entre a Terra e o Céu...
E se formos capazes de orar contritos e serenos, nesses momentos de evocação, orvalhando as flores da saudade com a bênção da esperança, sentiremos a presença deles entre nós, envolvendo suavemente nossos corações com inefáveis perfumes de alegria e paz.

Richard Simonetti

e-mail: richardsimonetti@uol.com.br

domingo, 4 de fevereiro de 2018

A desencarnação

Atendendo a programa traçado por nossos Maiores, visitávamos o Centro Espírita Paz e Amor, a fim de avaliarmos as possibilidades de ampliação de atividade.
Impunha-se, inicialmente, contato e observação de seu dirigente, senhor Belarmino.
Fomos encontrá-lo não muito distante, na secretaria, em diálogo com um jovem.
Pois é, senhor Belarmino, estimaria muito trabalhar aqui, neste Centro. Estou convencido das verdades espíritas, creio que o que resta é o trabalho por mim e pela causa.
- Ótimo, meu filho. O trabalho é que consolida nossa convicção. No entanto, no momento não tenho onde aproveitar. Volte mais tarde...
Daí a instantes, Belarmino está a expor a um companheiro de lides.
- É... Daniel, não é possível. O plano de trabalho é bom, mas não temos gente para colaborar.
- Mas, Belarmino, há pouco um jovem estava a oferecer-lhe os préstimos!
- Daniel, como você é ingênuo. Então você acha que, realmente esses jovens querem trabalhar? Que nada, isso é fogo de palha.
- Com licença – diz um senhor, aproximando-se. – Venho de cidade em que estava integrado no serviço doutrinário do Espiritismo. Em determinado dia da semana, fazia exposições sobre o Evangelho e o Espiritismo. Também ajudava na tesouraria do Centro, pois sou contador. Gostaria, assim, de fazer alguma coisa neste Centro. Há meses que já frequento, quero trabalhar, irmão Belarmino.
- Muito bem, Lúcio, contamos com você. Por hora, no entanto, nada temos. Como você sabe, já temos os minutos de estudo distribuídos e o trabalho na tesouraria já vem sendo resolvido por Otávio...
- Quando o senhor tiver qualquer coisa para fazer, não se esqueça, chame-me. Até logo...
- Belarmino, eis aí mais uma oportunidade para crescer a equipe de seareiros.
- Qual, Daniel, você tem muito que aprender ainda. Precisa ter cuidado com essa gente que chega pedindo serviço. O que eles querem, de fato, é pegar cargo para tomar conta do Centro. Comigo, não! Hei de cuidar e vigiar sempre nossa Casa de Oração.
O tempo rolou em sua marcha irrefreável.
Novamente, por determinação de nossos Irmãos Maiores, visitamos a Casa Espírita, colhendo informações a respeito de seu desenvolvimento no mister de oferecer o Espiritismo, cada vez mais, aos necessitados.
Estranhamos a porta fechada.
Silêncio absoluto.
Entramos.
Móveis empoeirados.
Defrontamos com o Dirigente Espiritual.
- Belarmino desencarnou há quase um ano.
Por falta de gente e continuidade, também o Centro desencarnou com ele ...

Hilário Silva
Psicografado em reunião privativa, na cidade de Lins, em 21/11/1974.

Fonte:
Histórias e Recados do Mundo Espiritual – Depoimentos e Reflexões
Psicografia de Aylton Paiva – 2ª edição – Mythos Editora Ltda.


Aylton Paiva é estudioso da Doutrina Espírita para sua aplicação na pessoa e na sociedade (www.ayltonpaiva.blogspot.com).