domingo, 26 de novembro de 2017

Bênçãos e maldições

O ato de abençoar implica em desejar o bem de alguém.
Assim como a oração, o alcance da bênção depende de nosso envolvimento com ela, dos sentimentos que mobilizamos.
O pai que, displicentemente, abençoa o filho que vai dormir, sem desviar a atenção do programa de televisão, não vai além das palavras.
Já a mãe diligente, que leva a criança ao leito, conversa com ela, conta-lhe uma história e a beija carinhosamente, põe a própria alma ao abençoá-la, envolvendo-a em poderosas vibrações de amor, com salutar repercussão em seu sono.
Ao contrário da bênção, amaldiçoar é desejar o mal de alguém.
Que vajas bien, que te pise el tren.
O fato de desejarmos que uma pessoa seja atropelada por um trem, como sugere este chistoso ditado espanhol, não implicará, evidentemente, nesse funesto acontecimento. Não possuímos poderes para tanto, nem Deus o permitiria. Mas podemos perturbar nosso desafeto.
A maldição é um pensamento contundente, revestido de carga magnética deletéria, passível de provocar reações adversas no destinatário – nervosismo, tensão, irritabilidade, mal-estar…
Se, porém, o amaldiçoado é uma pessoa bem ajustada, moral ilibada, ideias positivas, sentimentos nobres, nada lhe acontecerá. Simplesmente não haverá receptividade para nossa vibração maldosa.
O mesmo ocorre em relação ao ato de abençoar. Os pais desejam muitas bênçãos para seus filhos. Que sigam caminhos retos; que sejam aprendizes aplicados; que se realizem profissionalmente; que cultivem moral elevado; que sejam felizes...
Ainda que se situem por poderosos estímulos, suas bênçãos pouco representarão se os filhos preferirem caminhos diferentes.
Nem por isso devem deixar de abençoá-los. Suas bênçãos inibirão os impulsos mais desajustados dos filhos, trabalharão suas consciências adormecidas e acabarão por despertar neles impulsos de renovação, quando a vida lhes impuser suas amargas lições.
Bênçãos e maldições são como bumerangues, aqueles brinquedos australianos, em forma de arco, que retornam às nossas mãos quando os atiramos.
Se amaldiçoarmos alguém, odientos, o mal que lhe desejamos voltará, invariavelmente, para nós, precipitando-nos em perturbações e desequilíbrios. Somos vitimados por nosso próprio veneno.
Em contrapartida, aquele que abençoa alimenta-se de bênçãos, neutralizando até mesmo vibrações negativas de eventuais desafetos da Terra ou do além.
Jesus conhecia como ninguém esses princípios. Por isso, antecipando que os discípulos enfrentariam muitas hostilidades na difusão do Evangelho, recomendava-lhes:
“Quando entrardes numa casa, dizei:
− A paz esteja neste lar.
Se, com efeito, a casa for digna, venha sobre ela a vossa paz; se, porém, não o for, torne para vós outros a vossa paz."
Temos aqui preciosa orientação. Observando-a, ainda que, onde formos, as pessoas estejam pouco dispostas a entronizar a paz, ela não se ausentará de nosso coração.
Nem sempre os beneficiários de nossas iniciativas, quando cultuamos a vocação de servir, mostram-se reconhecidos.
Que isso jamais nos iniba. O ato de servir tem suas próprias compensações. Exercitando-o, a distribuir bênçãos de auxílio, habilitamo-nos às bênçãos de Deus.

Richard Simonetti

e-mail: richardsimonetti@uol.com.br

domingo, 19 de novembro de 2017

Nossos filhos

Certo dia, quando eu voltava do trabalho, já ao cair da noite, passava pelo calçadão quase deserto, quando vi uma adolescente com uma mochila nas costas, agasalho tipo jaqueta, como estas estudantes em dia de viagem. Estava a falar no telefone público, e pelo tom alto de sua voz, dava a entender que era interurbano. Então pude ouvir a seguinte frase: Cadê o pai? Cadê o pai? Esta frase tão comum que ouvimos quase que diariamente em nosso próprio lar, partindo daquela jovem, naquele momento em que provavelmente se encontrava longe de casa e talvez dependendo de uma orientação qualquer e às vezes até de recursos financeiros do pai para se conduzir dali em diante, levou-me a refletir sobre a importância da responsabilidade e influência dos pais na formação moral, intelectual e religiosa de seus filhos.
Sabemos das dificuldades e insegurança dos jovens e também da preocupação dos pais quando se tem que estudar e morar fora de casa, por exemplo, situação em que ficam sem aquele contato mais direto com a família, quando não se pode acompanhar mais de perto suas atividades no meio social em que passarão a conviver. Sabemos também, que cada filho é um espírito diferente, com uma rota diferente no caminho da evolução, com suas virtudes e seus pontos vulneráveis diferentes uns dos outros, com divergências no comportamento, nas necessidades afetivas, no grau de compreensão, no temperamento emocional, na inteligência, etc. Isso nos faz sentir a necessidade de olharmos para nossos filhos de maneira carinhosa, procurando identificar em cada um deles as suas necessidades, tanto na parte material como espiritual, e assim procurarmos orientá-los da maneira que acharmos a mais correta, e principalmente pelo exemplo que lhes passamos através de nossos procedimentos, nossas atitudes, nossas palavras ou nosso comportamento social.
Devemos enquanto são crianças plantar em seus corações a sementinha da fé religiosa, do amor ao próximo, alertá-los para a necessidade da prece, do amparo aos mais necessitados através dos variados caminhos da caridade, para que no futuro, quando já se sentirem donos de si mesmos, estas sementinhas possam germinar como no terreno fértil previamente preparado pelo agricultor. Só assim encontrarão a assistência de que precisam para manterem o equilíbrio em seus momentos de dificuldades tão frequentes em nosso dia-a-dia.
Os ensinamentos espíritas nos dizem que nos primeiros anos de vida de nossos filhos está a grande oportunidade que temos para edificar a plataforma na qual se sustentarão durante toda sua vida.
Ao chegar em casa, encontrei na sala, meu filho que assistia a um programa de esportes na televisão, e que me recebeu sorridente, dizendo: Olá paizão! Está com cara de preocupação ou de cansaço do trabalho? Então, sorrindo eu lhe respondi: Nada disso filho, na verdade, estou muito contente e agradecido a Deus, por ter vocês e o meu trabalho.
Nelson Nascimento

e-mail: nelson.nascimento1@yahoo.com.br

domingo, 12 de novembro de 2017

Cenas da rua, vivências da vida

À porta de uma loja de eletrodomésticos, aguardava minha esposa que conversava com o vendedor sobre as condições de compra de um objeto que ela precisava.
Um adolescente, acompanhando os pais, que também faziam compra na loja, tomava refrigerante em um copo plástico, descartável.
Saboreou o líquido até as últimas gotas, depois se aproximou da porta e atirou o copo em direção à rua, onde, naquele momento, passavam veículos.
Próximo dele havia um cesto para coletar lixo.
Passados alguns dias, vou caminhando pela calçada. Alguns passos adiante seguem duas jovens, com o característico jaleco branco de quem trabalha na área da saúde.
As duas pararam. Uma delas abaixou-se pegou um copo plástico, vazio, com o característico símbolo de famosa empresa multinacional de refrigerantes, que estava jogado no chão.
Continuaram a caminhada e eu, seguindo, o meu rumo normal, atrás e observando...
Mais alguns quarteirões e divisaram um coletor público de lixo.
A que segurava o copo aproximou-se e depositou o entulho plástico no lugar adequado e seguiram alegremente conversando.
Este episódio, mentalmente, ligou-me com o outro. Aquele do jovem na loja.
No mesmo instante refleti: cenas da rua, vivências da vida.
De uns tempos a esta parte os princípios de educação e ecologia vêm sendo divulgados pela escola, pela televisão, por revistas e jornais.
É quase impossível que uma pessoa vivendo em um lar, frequentando uma escola, assistindo programas na televisão não saiba que não se deve atirar um copo plástico na rua, ainda mais em direção a veículos transitando pelo local.
É quase absoluta a certeza de que o jovem sabia que seu ato transgredia as normas de educação e de respeito ao meio ambiente.
Por algum motivo as formas de educação não estavam funcionando para o jovem.
Por outro lado, as jovens profissionais, que entraram em uma clínica de fisioterapia, onde, por certo, trabalhavam, “perderam” um momento para atender ao interesse da coletividade e procuraram sanar o ato de outro deseducado que havia lançado outro copo de plástico na via pública.
Eram jovens educadas e conscientes do respeito ecológico pelo planeta Terra, que se reflete sim no, aparente, simples ato de recolher um lixo plástico da rua.
Só para refletirmos nessa contaminação: copo plástico leva de 200 a 450 anos para se desintegrar; lata de alumínio: 100 a 500 anos; garrafa de plástico: mais de 500 anos, pilhas e baterias: 100 a 500 anos, com grave contaminação no solo e na água que ele contém.
Portanto, o amor ao próximo, o amor à vida, o amor ao planeta depende tanto de providências tão simples como a de destinar o lixo orgânico e inorgânico ao lugar certo quanto aos grandes atos de preservação ambiental desse organismo vivo que é a nossa casa planetária.
A Doutrina Espírita, expressa em O Livro dos Espíritos (1), em sua Terceira Parte – Das Leis Morais, nos capítulos: V – Da Lei da Conservação e VI – Da Lei da Destruição, conceitos sobre a necessidade de atos de preservação da vida e do planeta.
Destarte, as cenas de rua relatadas se projetam em vivências comportamentais para a conservação ou destruição da vida e do nosso admirável e maravilhoso planeta.
Vamos refletir:
Estamos atirando copos plásticos na rua ou estamos colhendo os jogados e depositando-os, com amor, nos recipientes de preservação da Vida?

Bibliografia:
1 – O Livro dos Espíritos, Allan Kardek, Ed. FEB.

Aylton Paiva é estudioso da Doutrina Espírita para sua aplicação na pessoa e na sociedade (www.ayltonpaiva.blogspot.com).


Obs.: Artigo publicado em 03/02/2012, no Jornal Correio de Lins

domingo, 5 de novembro de 2017

Desejável paixão

Richard Simonetti
O senhor Felício esteve num programa de televisão em que eram entrevistadas pessoas idosas, convidadas a falar sobre a velhice.
Tinha oitenta e cinco anos. Aparentava sessenta, espirituoso, bem disposto, dono de uma incrível jovialidade.
— Nunca me senti velho — dizia.
— E o corpo? — perguntou o entrevistador.
— Já não tem a mesma vitalidade; não raro, há grilos de saúde, o que é natural. Trata-se de uma máquina.
— Vai se desgastando…
— Exatamente, mas o motor está ótimo, nos dois sentidos: bombeia, incansável e eficientemente o sangue, levando o oxigênio a todas as províncias do corpo sem ratear, e me mantém permanentemente enamorado de encantadora donzela.
— O senhor, na sua idade, apaixonado por uma jovem?! — admirou-se o entrevistador.
— Sim, meu filho. Apaixonadíssimo!
— E podemos conhecer essa pessoa maravilhosa, que faz seu encanto?
— Claro, claro, mesmo porque todos devem fazer o mesmo, em favor de uma existência feliz.
Sorridente, o senhor Felício explicou:
— Sou apaixonado pela vida. Adoro viver. Intimamente sinto-me eterno jovem. Nunca experimentei o peso dos anos ou a angústia de envelhecer. Cada dia é uma aventura que aproveito integralmente.
— Qual a fórmula mágica para essa perene juventude emocional, essa esfuziante alegria? Nossos telespectadores vão adorar sua orientação.
— Elementar, meu filho. Toda manhã, ao fazer a barba, converso comigo mesmo ao espelho e afirmo: “Felício, você tem duas alternativas neste dia: ser feliz ou infeliz. A escolha é sua”.
— Escolhe ser feliz?
— Evidente! Seria um tolo se não o fizesse. Afinal, a opção é sempre nossa.
E ante o maravilhado entrevistador:
— Simples, não?
***
O Senhor Felício é dessas raras pessoas conscientes de que a felicidade não é uma estação na viagem da existência humana. Felicidade é uma maneira de viajar.
E não está subordinada à satisfação de nossos desejos, diante da Vida, mas ao desejo de descobrir o que ela espera de nós. A propósito desse tema tão caro a todos nós, alguns pensamentos interessantes:
Os homens que procuram a felicidade são como bêbedos que não conseguem encontrar a própria casa, mas sabem que tem uma. (Voltaire)
Dá-se com a felicidade o que se dá com os relógios: os menos complicados são os que enguiçam menos. (Chamfort)
Encher a hora – isso é que é a felicidade. (Emerson)
Felicidade é a certeza de que a nossa vida não está se passando inutilmente. (Érico Veríssimo)

Por último, o notável poema, Velho Tema, de Vicente de Carvalho, que nos oferece a mais perfeita explicação sobre a escassez de felicidade entre os homens:

Só a leve esperança, em toda a vida,
Disfarça a pena de viver, mais nada;
Nem é mais a existência, resumida,
Que uma grande esperança malograda.

O eterno sonho da alma desterrada,
Sonho que a traz ansiosa e embevecida,
É uma hora feliz, sempre adiada
E que não chega nunca em toda a vida.

Essa felicidade que supomos,
Árvore milagrosa que sonhamos
Toda arreada de dourados pomos,
Existe, sim; mas nós não a alcançamos,
Porque está sempre apenas onde a pomos
E nunca a pomos onde nós estamos.

Richard Simonetti

e-mail: richardsimonetti@uol.com.br