domingo, 29 de outubro de 2017

O naufrágio

(Reflexão)
O barco naufragara sem que todos conseguissem apanhar suas bóias de salvamento.
Um cidadão que ficara sem ela estava a flutuar bem próximo de uma e com tranqüilidade esperava o momento oportuno para alcançá-la diante dos agitados movimentos de vai-e-vem das águas.
Sabia flutuar muito bem e aguardava na certeza de que a qualquer momento pudesse agarrá-la.
Com o balanço do mar a bóia se locomovia e ele também, mantendo sempre a mesma distância que o impossibilitava de pegá-la.
Os minutos se passaram, o cansaço já o abalava, e assim, após algum tempo, a bóia foi se distanciando, a margem que não longe se via...desaparecendo.
Alcançou ele a corrente marítima, que também levou para mais longe o instrumento que lhe dava esperanças, arrastando-o com violência para as profundezas depois de esgotadas suas energias físicas.
Outro náufrago, despejado pela embarcação nas mesmas condições, apavorado pela turbulência jamais vista por ele, debatia-se desesperado sem visualizar objeto algum em que pudesse se segurar e dar-lhe esperanças de salvamento.
Respirava fundo, toda vez que a água se afastava de suas narinas, e desprendendo esforço inusitado, começou a nadar com braçadas vigorosas superando as próprias condições físicas.
Depois de algum tempo, quase inconsciente, sentiu a seus pés a acariciante massagem da areia branca do leito do oceano. Afirmou-se, o andar titubeante, e quase sem forças alcançou a praia deserta, e lançou-se ao solo para merecido descanso.
Estabelecendo certa comparação entre o desejo de sobrevivência do naufrago e os anseios da alma, nos leva a meditar sobre a salvação tão almejada, que entendo como sendo a conquista de uma boa posição na escala evolutiva espiritual, e, as condições para alcançá-la.
O salva vidas representado pelos alertas de comportamento moral e religioso que nos aparece a todo instante, e que nos faz acreditar às vezes, que não é para nós, quando nos colocamos em posição de tranqüilidade e suposta sabedoria, pode fugir das nossas mãos em virtude da nossa passividade e inércia, nos arrastando para o desconforto e a desesperança.
O vigor que nos sustenta, que nos dá chance de vitória, e que independe de nossa força física, e sim do nosso preparo interior, composto de:  responsabilidade, bom caráter, sentimento de solidariedade, equilíbrio, fé, capacidade de perdoar, e disposição para a ação no bem; precisa ser ativado, ou seja: exercitado, para nos impulsionar em direção ao objetivo que nos convém alcançar.
A tábua de salvação chegará até nós pelos nossos próprios esforços em conquistar as virtudes necessárias para merecê-la, e nunca pelo bel prazer das ondas de influências bajuladoras e promessas nas quais muitas vezes flutuamos no mar da vida.

Nelson Nascimento

e-mail: nelson.nascimento1@yahoo.com.br

domingo, 22 de outubro de 2017

A indignação de um bom

Sem dúvida, quando vemos os atos de improbidade administrativas nos diferentes órgãos governamentais, sentimos a indignação e mesmo a revolta.
Encontramos na questão nº 930 de O Livro dos Espíritos, de Allan Kardec, a indagação:
“Por que, no mundo, tão amiúde, a influência dos maus sobrepuja a dos bons?”
E os Mentores Espirituais responderam:
“ – Por fraqueza destes. Os maus são intrigantes e audaciosos, os bons são tímidos. Quando estes o quiserem, preponderarão”.
No relato, abaixo, temos o admirável exemplo de um “bom”, juntamente com o seu público, indignando-se e agindo contra os maus.
Giuseppe Fortunino Francesco Verd, foi compositor de óperas do período romântico italiano. Considerado, então, o maior compositor nacionalista da Itália.
Foi um dos compositores mais influentes do século XIX. Suas obras são executadas com frequência em Casas de Ópera em todo o mundo e, transcendendo os limites do gênero, alguns de seus temas estão, há muito, enraizados na cultura popular.
Entre esses, Va, pensiero, o coro dos escravos hebreus, da ópera Nabucco.
Nabucco é uma ópera em quatro atos, escrita em 1842. Conta a história do rei Nabucodonosor da Babilônia.
Por ter sido escrita durante a ocupação austríaca no norte da Itália, dadas as tantas analogias que apresenta, suscitou o sentimento nacionalista italiano.
O coro dos escravos hebreus, no terceiro ato da ópera, tornou-se uma música-símbolo do nacionalismo italiano da época.
No mês de março do ano em curso (2011), no teatro da Ópera de Roma, esse coro levou os cantores e músicos à muita emoção. E o público presente, ao delírio, numa grande demonstração de fé patriótica.
O maestro Riccardo Muti acabara de reger o célebre coro dos escravos. Va pensiero. O público aplaudia incessantemente e bradava bis!
O maestro, então, se volta para a plateia e recorda o significado patriótico do Va pensiero que, além de sua intrínseca beleza, que é inexcedível, tem enorme apelo emocional, até hoje, entre os italianos.
Riccardo, pede ao público presente que o cante agora, com a orquestra e o coro do teatro, como manifestação de protesto patriótico contra a ameaça de morte contida nos planejados cortes do orçamento da cultura.
Ele rege o público, enquanto a orquestra e o coro se irmanam na execução do hino, cujos versos podemos assim traduzir:
Voa, pensamento, com tuas asas douradas. Voa, pousa nas encostas e no topo das colinas, onde perfumam mornas e macias as brisas doces do solo natal!
Cumprimenta as margens do rio Jordão, as torres derrubadas de Jerusalém...
Oh, minha pátria tão bela e perdida! Oh, lembrança tão cara e fatal!
Harpa dourada dos grandes poetas, porque agora estás muda?
Reacende as memórias no nosso peito, fala-nos do bom tempo que foi!
Traduz em música o nosso sofrimento, deixa-te inspirar pelo Senhor para que nossa dor se torne virtude!
***
As câmeras passeiam pela plateia, mostrando a emoção, a unção. Quem sabia a letra, cantou. Quem não sabia, acompanhou a melodia.
Foi uma verdadeira prece.
Prece ao Senhor, rogativa às autoridades. Um exemplo de patriotismo.
Um maestro que clama, chora e concita o povo a bradar pela manutenção do bom, do belo, da cultura.
Alguém que, consciente da sua cidadania, vai além do seu dever como artista.
Serve-se do palco, da plateia, para esclarecer, para despertar consciências, para lutar pelo ideal que defende.
Que se repitam no mundo, em todas as nações, tal grandioso exemplo para que não se percam as raízes, para que se preserve a cultura, a arte, o belo.

Redação do Momento Espírita, com base nas imagens do vídeo do link http//.youtu.be/g_gmto6jnrs (recebido pela internet)

Aylton Paiva é estudioso da Doutrina Espírita para sua aplicação na pessoa e na sociedade (www.ayltonpaiva.blogspot.com).


Obs.: Artigo publicado em 27/01/2012, no Jornal Correio de Lins

domingo, 8 de outubro de 2017

Nosso dia

Toda manhã é novo dia com novas oportunidades de aprendizado:
A paciência o ajudará a superar obstáculos considerados intransponíveis.
Os objetivos da vida sugerem reflexões importantes:
Aproveite cada minuto para reflexões relativas a tomadas de decisões.
Atribulações o induz a reservar alguns minutos para pensar:
O futuro promissor é alvo a ser alcançado com a capacitação e o esforço próprio.
Aproveite hoje:
E renda-se á disposição de perdoar.
Dê a você mesmo um dia de trégua:
Analise as críticas dos supostos inimigos.
Surpreenda-se com sua atitude:
Diga bom dia a um desafeto seu.
Sempre é tempo de acelerar o seu progresso espiritual:
Faça uma boa ação.
O dia de hoje não é ontem:
Melhore o seu comportamento junto ao semelhante.
Neste momento você tem condições de ajudar:
Amanhã só Deus sabe.
Sempre é dia de renovação:
Faça algo de bom diferente do que você já fez.
O sol aquece todos os seus dias:
Aqueça o coração de alguém com palavras de conforto.
Deixe a vida te levar para a trilha da felicidade:
Com responsabilidade, dignidade, e amor.

Nelson Nascimento

Luz nas sombras

Richard Simonetti
Mirradinho e feio, com oito anos aparentava seis... Socialmente, um desastre! Artur era um problema na escola especializada em crianças especiais. Inquieto, agressivo… Tormento dos menores, permanente preocupação para professores e recreacionistas. Embutido em si mesmo, não se comunicava... Só agredia, habilidoso na arte de desferir pontapés.
Ana Rosa, inteligente orientadora pedagógica da instituição, conversou com ele.
Oi! Tudo bem?...
O menino fitou-a, impassível. A jovem tocou-o de leve, ensaiando carinho. Ele se colocou na defensiva, armando o pé para o golpe certeiro.
— Não gosto de você! — falou, ameaçador, como fazia sempre que alguém tentava contato.
Pois eu gosto muito de você! — respondeu, sorridente.
Surpreso, Artur afastou-se a correr.
Ana Rosa estudou seu prontuário. Visitou sua residência. Consultou a vizinhança. Era filho de mãe solteira, que o abandonara recém-nascido. Quem cuidava dele era uma velha tia, alcoólatra, que, quando embriagada, divertia-se surrando-o. O garoto nunca conhecera ternura, solicitude, atenção...
Ana Rosa emocionou-se. Dispôs-se a ajudá-lo. O primeiro passo era ganhar-lhe a confiança. Sobrepondo-se à sua insociabilidade, repetia sem­pre:
Eu gosto de você!
Tornou-se refrão. Onde se encontravam, a saudação infalível:
— Oi, Artur!... Não se esqueça: Eu gosto de você!...
O gelo começou a dissolver-se. Para surpresa geral, o menino permitiu uma aproximação. Brincavam juntos. Aos poucos, ela ganhou acesso ao seu mundo interior repleto de temores e angústias, sombras que afastava, uma a uma, com a luz infalível:
Eu gosto de você!
Artur começou a se modificar. Tornou-se comunicativo, aprendeu a sorrir... Ensarilhou as armas escondidas nos pés. Já era capaz de conviver com outras crianças, sem atritos.
E veio a surpresa: revelou dotes promissores de inteligência e sensibilidade. Longe da excepcionalidade, era apenas um menino amedrontado que se escondia num mundo de fantasia resguardado pela agressividade.
Meses mais tarde, habilitou-se a ingressar numa escola para crianças de nível mental mais desenvolvido.
Abraçando-o, Ana Rosa despediu-se, dizendo-lhe ternamente:
   Eu o verei sempre, Artur. E não se esqueça: Eu gosto de você!
Emocionado, aquele Espírito que despertara para a vida graças a alguém capaz de amar incondicionalmente, respondeu, voz entrecortada de lágrimas:
  Eu também gosto muito, muito mesmo, de você!
***
Há algo de fundamental, sem o que, literalmente, nossa alma definha, qual planta sem alimento. Chama-se Amor!
Particularmente na infância, quando o Espírito atravessa um período difícil de adaptação à nova existência, marcado por dúvidas e temores, o amor é fundamental.
Por isso, diante dos problemas que afetam a alma infantil, nenhum tratado de psicologia, por mais minucioso e erudito, terá a eficiência de quatro palavrinhas mágicas musicadas com ternura:
— Eu gosto de você!
  
Richard Simonetti



domingo, 1 de outubro de 2017

A resignação e a resistência

Aylton Paiva
“Bem-aventurados os que choram, pois que serão consolados” Jesus (Mateus, cap. V, v.5).
No sentido em que Jesus ofereceu o consolo aos que choram depreende-se que esse choro é causado pela aflição do sofrimento; por algum tipo de dor, seja ela física ou moral.
Dificilmente haverá uma pessoa que ao atingir a maioridade não tenha sofrido algum tipo de dor. Que, de alguma maneira, não tenha vertido o pranto dolorido.
Diante da dor poderemos adotar dois tipos de comportamento: a resignação e a resistência.
No dicionário Aurélio encontramos a seguinte definição para resignação: “3. Submissão paciente aos sofrimentos da vida”.
Nele encontramos, também, com a definição para resistência: “3. Força que defende um organismo do desgaste de doença, cansaço, fome, etc.”
No decorrer da vida, o ser humano depara-se com dores como: doenças, fracasso financeiro, fracasso amoroso, morte, entre outros tantos.
Como reagir, então, ante os sofrimentos?
Poderemos ter dois tipos de comportamento: resignação – comportamento passivo e a resistência – comportamento ativo que busca solução para acabar ou diminuir o sofrimento.
No enfrentamento ao sofrimento deveremos ter as seguintes atitudes:
1.   Ter uma percepção clara da fonte do sofrimento.
Separar aquilo que é real da imaginação.
2.   Analisar os possíveis recursos para superar a dor.
Como deveremos agir com entendimento, bom senso e o que fazer para sobrepujar a dor.
3.   Aceitar o que pode e o que não pode ser modificado, mudando a forma de enfrentamento para uma ação ou vivência mais adequada e que diminua o sofrimento.
Compreensão realista para agir adequadamente.
4.   Os fatos são importantes (causas da dor), porém o mais importante é a maneira como se enfrenta os fatos (estado emocional), de modo realista ou fantasioso.
Ter, dessa forma, a visão clara do foco da dor e da melhor forma de se comportar diante dele, procurando sentir a realidade e fugir da ilusão e da imaginação exacerbada.
Seguindo esses passos poderemos enfrentar a dor melhor preparados para agir pelo caminho da resignação ou pela senda do enfrentamento.
Estaremos, deste modo, aparelhados, com equilíbrio emocional, para calmamente atuarmos a fim de eliminar ou diminuir a dor que nos aflige.
É atribuída ao teólogo Reinhold Niebuhr a oração da Serenidade, que assim propõem: “Concedei-me, Senhor, a serenidade necessária para aceitar as coisas que não posso modificar, coragem para modificar aquelas que posso e sabedoria para distinguir umas das outras”.
Consideremos, ainda, o Espiritismo nos ensina que a dor, seja ela qual for, não é um castigo divino, pois Deus não castiga, Ele educa e aprimora seus filhos, suas criaturas, pelos caminhos da evolução no sentido da felicidade.
Portanto, a dor tem um caráter educativo e precisamos, pois, retirar dela as experiências pedagógicas que nos oferece.
Resignação e resistência são dois instrumentos importantes na construção da nossa felicidade.
Vamos treinar para usá-las sempre e, cada vez, de forma mais apropriada e eficiente.

Aylton Paiva é estudioso da Doutrina Espírita para sua aplicação na pessoa e na sociedade (www.ayltonpaiva.blogspot.com).


Obs.: Artigo publicado em 20/01/2012, no Jornal Correio de Lins