domingo, 10 de dezembro de 2017

O Passaporte

(Reflexão)

Embalado pelas meditações sobre a vivência terrena, ele adormeceu. E viajando pelas veredas do sono, o carrossel confortável do relaxamento físico lhe permitia vislumbrar caminhos diferentes dos que estava acostumado a trilhar. Tudo estava bem, a visualização que mentalizava lhe mostrava coisas prazerosas do conforto, do bem estar que a vida lhe proporcionava. Trazia consigo a satisfação de ser aquilo que sempre pretendera ser. Estava tranquilo consigo mesmo, tudo que realizara a seu ver estava correto, se vangloriava por isto.

As coisas aconteciam como inexplicável e maravilhoso deslumbramento, mas as condições de vivência do momento lhe deixavam confuso, incerto, até que a situação lhe colocou em questionamento diante de vigoroso e educado recepcionista, que lhe perguntou: - Seu passaporte meu irmão? - Que passaporte é esse se não se lembrava de embarcar em nenhum veiculo com destino certo ou mesmo ignorado? Foi então que o recepcionista lhe informou: - Procure na bagagem da sua consciência, e encontrará os registros indeléveis arquivados com carinho, e que lhe darão a devida autorização para a livre locomoção às estâncias a que tiveres o direito de transitar e viver. Mas suas bolsas estavam cheias, a fortuna lhe sorria, seus cofres com muitas joias, seu prestigio social era incontestável... Indignado e aborrecido com a ousadia de lhe pedirem um passaporte, questionou com voz arrogante: - Porque me pedes um passaporte? Foi quando a resposta lhe chegou através de um simples olhar meigo e carinhoso do recepcionista... Então ele viu-se despojado de tudo, até mesmo de suas vestes valiosas que gostava de ostentar. Sua memória retrocedia incontrolavelmente, com pensamentos e visualizações a principio confusas, mas depois com incrível realidade: fora injusto com os semelhantes em muitas situações, a ascendência material que tivera foi alicerçada em prejuízo de muitas vítimas inofensivas e necessitadas, fora cruel, irresponsável, desonesto, e bajulador daqueles que compartilhavam consigo a mesma ganância e sede de poder. Assustado indagou: - Onde minha fortuna, onde meus defensores, onde aqueles que promovi para que me ajudassem? Tudo em vão... Estava só diante de tantos questionamentos. Então o recepcionista lhe informou: - A leitura de seu passaporte lhe permite entrada e estadia no setor de recuperação, para que possa compreender os desígnios Divinos reservados a todos que necessitam do burilamento temporário e preparatório para novas etapas de vivências, reparações, e provações adequadas, através de ásperas condições que permitam o aperfeiçoamento do espírito. A partir dali ele prosseguiu caminhando desiludido pela paisagem ressequida, solo estéril, com atmosfera pesada e sombria, e o ar sufocante a dificultar-lhe a respiração... Em direção à comunidade que lhe acolheria até a próxima etapa de experiências terrenas.

Foi então, que ele pôde perceber a sua nova realidade: Estava em outro plano de vida. Fôra surpreendido quando tudo lhe parecia estar de acordo com os seus desejos. A atual circunstância mostrava-lhe a correspondência aos seus verdadeiros sentimentos, que alimentava durante a vida terrena. Nesse momento bateu-lhe à porta da consciência... O desespero ao pensar no recomeço, talvez mais difícil que a oportunidade de progresso que não soubera aproveitar durante a vida que lhe foi concedida.

A doutrina espírita sempre nos alerta de que as boas intenções, as boas ações, a pratica da caridade, e a retidão de caráter é que vai nos permitir situar nas regiões espirituais que aspiramos alcançar.


Nelson Nascimento

e-mail: nelson.nascimento1@yahoo.com.br

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